quarta-feira, 9 de outubro de 2013

HAPPY BIRTHDAY, JOHN - ARQUIVOS DO FUNDO DO BAÚ

Esse conto absolutamente de ficção é uma jóia rara! Apareceu aqui uma única vez, há 3 anos no aniversário de 70 anos de John. Em outubro de 1990, completava 10 anos que Lennon havia sido assassinado e o autor brinca com palavras e emoções como se ele tivesse "escapado" dos tiros de Chapman! Muito bacana. Isso foi publicado na revista "Cláudia" de outubro de 1990. Isso é fantástico!
Dia 9 deste mês, Lennon comemora 50 anos de vida. Está mais velho, continua casado com Yoko e sonha ganhar um neto, em breve. Lennon escapou da morte, há dez anos. Recebeu dois tiros na perna, um na mão e outro na testa. Eram pouco mais de 11 horas daquela quentíssima noite de outono, em Nova York. 8 de dezembro de de 1980. Por pouco, John Lennon e Yoko Ono não se tornavam dois novos personagens de um tipo de tragédia que de vez por outra ronda a vida dos artistas. Um fã do ex-Beatle aguardava o casal do lado de for a do Edifício Dakota – onde eles moram -, em pé, lendo O Apanhador no Campo de Centeio, de J. D. Salinge. Não queria um autógrafo do ídolo, tampoco tocá-lo. Horas antes, aquele jovem conseguira um autógrafo de Lennon no disco recém-comprado. “Ao vê-lo andando na rua desacompanhado, pensei que alguém poderia matá-lo. E por que não eu?”, diria Mark David Chapman aos jornalistas, em seguida a sua prisão. Chapman bem que tentou. Ao avistar John e Yoko se aproximando da entrada do Dakota, atirou Salinger no chão. Apressou o passo e gritou: ‘John’. Lennon virou-se lentamente em direção a ele, e Mark Chapman apertou o gatilho do revólver que empunhava. Quatro vezes. Quatro balas certeiras contra o corpo de John, que, mesmo caindo, procurou proteger Yoko dos disparos. Dois tiros acertaram sua perna direita. Um outro, a mão esquerda. O quarto atingiu a testa de raspão. De madrugada, no quarto 322 do Hospital Roosevelt, Lennon demonstrava que se refazia do susto. “Yoko, que tal mandar buscar uma pizza?” Ela o atendeu prontamente, não sem antes consultar o médico. “John, há centenas de jornalistas lá fora. Querem saber se você perdoa o rapaz que atirou”, insistiu a mulher. “Não perdoo ninguém. Quero que ele se dane.”John Lennon escapara do atentado, dando mostras de que o susto não lhe roubara a irreverência. Anos mais tarde, ao relembrar o episódio em uma entrevista concedida à revista Business Week, ele diria: “Não tenho compromisso com os meus fiéis para defender perdão a idiotas como esse Chapman. Jamais desculparia aquele maluco do Ali Agca, como fez o papa João Paulo II. Se pudesse, o esganaria com minhas próprias mãos”. Um evidente exagero. Lennon já era um pacifista muito antes de o movimento ganhar corpo. Na escola, nunca se importou de ser chamado de covarde ao recusar convites para brigas no pátio interno durante o recreio. Brigas mesmo, só pelas causas que desde cedo assumiu. No começo dos anos 60, John foi o primeiro a defender o uso dos cabelos longos pelos rapazes. Em Liverpool, as senhoras inglesas o olhavam sem disfarçar o horror. As moças, com um misto de curiosidade e estranhamento. Foi ele também quem introduziu os parceiros no uso das drogas, e o primeiro Beatle a abandoná-las. Antes do mergulho político do rock dos anos 80, Lennon já colocava as suas canções a serviço da militância. “Give Peace a Chance” (Dê uma Chance à Paz) e “Power to the People”(Poder para o Povo) são exemplos dessa fase. Em plena Guerra do Vietnã, no início dos anos 70, John lennon desafiava o Departamento de Imigração americano comandando manifestações pela paz e em favor dos soldados que desardaram. Por isso, sofreu sucessivos processos dos EUA. A alegação de que o comportamento licencioso de John era intolerável para os padrões americanos mal escondia os reais motivos da irritação da Casa Branca. John Lennon foi, durante vários anos, um sapo difícil de engolir pelo modelo americano de liberdade.
Comunista, como alguns o acusavam, Lennon nunca foi, embora quem não entendesse nada de inglês, julgasse que “Back in The U.S.S.R.”(De Volta à URSS) e “Revolution” – duas canções que fez com Paul McCartney – demonstrassem inequivocadamente sua vocação socialista. John também não era anarquista, apesar de sua alma anárquica. Capitalista, muito menos. “Embora nunca tenha negado os prazeres que o dinheiro pode comprar”, diz ainda hoje. Ele jamais foi mesmo fácil de rotular. Por isso, os milhões de fãs dos Beatles não podiam acreditar que a decisão de por fim ao conjunto tivesse partido de seu líder maior. Sim, porque, se o eleitorado beatlemaníaco se dividia entre o ar rebelde de John e o rosto-mocinho-bem-comportado de Paul, não restavam dúvidas sobre quem melhor representava o espírito Beatle. A culpa só podia ser dela. Sim, daquela oriental que se infiltrara no seio dos bravos rapazes de Liverpool para semear a discórdia.
Yoko Ono. Poucas mulheres foram tão odiadas como ela. E não porque John era um homem bem casado – com Cynthia, mãe de Julian, seu filho mais velho. Yoko, uma mulher, ao mesmo tempo feia e com ar lúgubre, definitivamente não parecia à altura do menino John. Os dois se conheceram em uma galeria de arte em Londres, Lennon soube que uma mulher estranha faria uma exposição lá, no dia seguinte ele ouvira dizer da tal mulher, artista plástica, que ela tinha o hábito de expor pessoas amarradas dentro de enormes sacos pretos. Não resistiu à curiosidade. Foi ao vernissage de Yoko. Percebeu quando o dono da galeria a empurrou ao seu encontro, mas somente mais tarde soube o que sussurou no ouvido dela. “Vamos, vá falar com ele. É um milionário...” Em 1965, John não era o mais conhecido dos Beatles. Ao menos para Yoko. O casamento dos Beatles acabou em 1970. Não resistiu à crise dos sete anos. O de John e Yoko parece fadado a terminar somente com a morte de um dos dois. Talvez sobreviva até mesmo à morte. Hoje, Lennon reconhece que ela fazia, sim, sua cabeça nos primeiros anos. “Vinte e três anos depois, é dificil saber quando qual de nós está com a cabeça do outro”, conta John Lennon. Ele que nunca se imaginara casado por muito tempo, ainda se assusta quando Yoko o provoca fazendo planos para as bodas de prata, marcadas para daqui a dois anos. “É estranho. Talvez a gente faça uma festa em um asilo para velhinhos, ou então eu escreva uma nova canção para ela”. A maior declaração pública de amor feita por John a Yoko aconteceu em uma longa entrevista que deu ao editor Jann Wenner, da revista Rollling Stone, há vinte anos. Nela, Lennon admite que poderia viver sem Yoko. “Posso, mas não quero. Não existe nada mais importante que a nossa relação. Eu não vou sacrificar este amor por nenhuma garotinha, nenhum amigo e nenhum negócio porque no fim acabaria ficando sozinho à noite. Não há nada melhor do que ser abraçado por alguém que você ame.” John ainda se lembra da entrevista, embora garanta nunca ler o que escrevem sobre ele. “Ou são mentiras, ou histórias que conheço de cor.” Da conversa com Jann Wenner para cá, muita coisa mudou. Até o amor de Lennon por Yoko. “Ele parou de crescer, porque já encontrou seu tamanho ideal.” Não. Ninguém poderá dizer que Yoko Ono é a responsável pela separação dos Beatles. O sonho acabou. Mas não foi por causa dela. John jamais se sentiu viúvo dos ex-companheiros. John, se viesse cantar no Brasil, como fez Paul McCartney este ano, jamais repetiria uma canção dos Beatles. Esta, a principal diferença. “O mundo caminha para a frente e é isso o que me interessa”, não se cansa de repetir a quem insiste em saber se algum dia os Beatles voltarão a se reunir. “Só depois que eu morrer”, garante. Este mês de outubro é especial para os Lennons. John, Yoko – que emprestou o sobrenome ao marido, em vez de assumir o dele – Sean, Jullian e, certamente, até para Cynthia, a ex. Sem medo de ser tachado de careta, john avisa que fará uma grande festa na porta do Edifício Dakota, onde tem cinco apartamentos e vizinhos famosos como o bailarino Rudolf Nureyev, o regente Leonard Bernstein e a atriz Lauren Bacall, para comemorar seus 50 anos de vida. “Não é todo dia que a gente se torna um senhor respeitável. Agora só falta meus filhos me derem um neto.” O palco do que poderia ter sido uma tragédia, há dez anos, será o cenário de uma festa no dia 9. John já enviou convites especiais a Elvis Presley, Jimi Hendrix, Bill Haley e Janis Joplin. Imagine este coro de vozes entoando o tradicional Happy Birthday. Você pode dizer que eu sou um sonhador. Mas, com certeza, eu não sou o único. Milton Belintani

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